EFEITOS FISIOLÓGICOS DO CONSUMO DE PROTEÍNAS E AMINOÁCIDOS NA SÍNTESE E REPARO DO TECIDO MUSCULAR

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O consumo de proteínas e aminoácidos sempre foi um dos principais aspectos observados no comportamento alimentar. As proteínas encontradas em produtos de origem animal e vegetal estão presentes em proporções e composições diferentes de aminoácidos.

Diferentes critérios podem ser usados para se estimar qualitativa e quantitativamente as necessidades proteicas do indivíduo. Podemos correlacionar as necessidades proteicas ao balanço de nitrogênio, bem como com a determinação indispensável dos tipos de aminoácidos que constituem. A caracterização da qualidade dessa proteína pela capacidade de atingir um balanço nitrogenado adequado,  fornecendo nitrogênio e aminoácidos indispensáveis de maneira eficiente para os mais diversos processos no organismo é de suma importância considerando por exemplo: grau de digestibilidade e a eficiência na sua utilização na dieta relacionados à renovação e síntese proteica em relação à manutenção e / ou eficiência para deposição ou desenvolvimento (crescimento) para tecidos-alvo diferentes e mais específicos como o tecido muscular ou ósseo.

Nesse sentido, temos as proteínas isoladas do soro do leite (WPI) como um excelente exemplo, com seus benefícios demonstrados em inúmeros estudos com os mais diversos direcionamentos.

A adequação no consumo de proteínas é importante, pois auxilia na manutenção do equilíbrio entre a Taxa de Síntese Proteica (TSP) e a Taxa de Degradação Proteica (TDP). HECTOR (2015) demonstrou que o consumo duas vezes ao dia de WPI resultou em uma atenuação do declínio pós-prandial da TSP durante uma dieta hipoenergética. Esta é uma descoberta importante porque indica que proteínas como WPI pode ser mais eficaz preservando TSP e potencialmente massa livre de gordura no processo de perda de peso a longo prazo.

Já na década passada, CAMPBELL (2004) em seu artigo sobre recomendações nutricionais para o atleta idoso, citou que a perda de massa muscular é um achado importante e as demandas proteicas nessa população estão diretamente relacionadas às demandas nutricionais pelo exercício resistido.

PHILLIPS (2015), um dos maiores pesquisadores sobre proteínas e exercício, demonstra que a proteína de soro de leite é uma das proteínas de mais alta qualidade, devido à sua rápida digestibilidade e ao seu conteúdo de aminoácidos essenciais, com destaque especial para a leucina. O consumo de proteína isolada do soro de leite tem uma capacidade consistente de estimular a síntese de proteína muscular.

A ação de WPI e seus componentes beta-lactoglobulina, alfa-lactoglobulina, imunoglobulinas e glicomacropeptídeos, deve-se principalmente à presença de receptores para proteínas e peptídeos no sistema imunológico. Uma das características importantes do soro de leite é a sua alta concentração de cisteína, fundamental para a síntese de Glutationa, sendo seus efeitos percebidos tanto na melhora do sistema imunológico quanto no sistema de defesa antioxidante (BUMRUNGPERT, MADADLOU, 2018).

JÄGER (2017), em seu posicionamento sobre o uso de proteínas, finaliza sugerindo que doses mais elevadas (40g) tem maior possibilidade de maximizar a TSP em idosos. E ainda, (VOLPI, 2003) afirma que o uso de WPI (por seu maior conteúdo de aminoácidos disponíveis) é  mais adequado para esse acréscimo proteico corporal

Diagrama simplificado detalhando o papel da disponibilidade de aminoácidos na regulação da síntese proteica muscular com a ingestão de aminoácidos / proteínas e exercícios. 

A creatina é um dos suplementos mais consumidos em todo o mundo, com alto grau de evidência científica e seu uso amplamente recomendado por várias instituições como por exemplo, o Comité Olímpico Internacional (COI) (Maughan, 2018).

Dentre as principais características da substância podemos destacar seu importante papel já evidenciado há décadas na ressíntese de ATP, melhorando a disponibilidade de energia para realização de atividades,  prevenção da atrofia muscular e perda de força, bem como para seu papel nas doenças neurodegenerativas dependentes da idade (ex.: Parkinson e Alzheimer) (TARNOPOLSKY, 2000).

Gualano (2016), apresenta várias metanálises assegurando o efeito da suplementação de creatina no  aumento do ganho de massa muscular, força e desempenho funcional em idosos submetidos a treinamento resistido (Figura 2).

Potenciais efeitos moleculares, bioquímicos e fisiológicos da suplementação de creatina no músculo esquelético

A glutamina é um nutriente essencial para a proliferação de linfócitos e produção de citocinas, atividades fagocíticas e secretórias de macrófagos e morte bacteriana de neutrófilos. A liberação de glutamina na circulação e disponibilidade é controlada principalmente por órgãos metabólicos, como intestino, fígado e músculos esqueléticos (BACHI, 2018).

Efeitos e utilização inter-tecidual da glutamina na saúde e doença (CRUZAT, 2018)

Durante situações catabólicas / hipercatabólicas, a glutamina pode se tornar essencial para a função metabólica, mas sua disponibilidade pode ser deficiente devido ao comprometimento na homeostase do metabolismo inter-tecidual de aminoácidos. Destaca-se sua participação na expressão de proteínas de choque térmico (HSP) e sua importância para o processo de reparo tecidual muscular (CRUZAT, 2009).

Por esse motivo, a glutamina atualmente faz parte dos protocolos clínicos de suplementação nutricional e/ou é recomendada para indivíduos que tenham desequilíbrio, como por exemplo em estados de imunossupressão (CRUZAT, 2018).

A combinação de proteínas WPI, creatina e glutamina é de suma importância para conferir maior eficácia na sua ação sinérgica, sendo uma excelente opção de suplemento nutricional para programas de hipertrofia ou melhora na qualidade e saúde nutricional em idosos, proporcionando eficiência máxima para as mais diversas situações na prática clínica ou esportiva.

Referências Bibliográficas:

BAGCHI, Debasis; NAIR, Sreejayan; SEN, Chandan K. (Ed.). Nutrition and enhanced sports performance: muscle building, endurance, and strength. Academic Press, 2018. / BUMRUNGPERT, Akkarach et al. Whey protein supplementation improves nutritional status, glutathione levels, and immune function in cancer patients: a randomized, double-blind controlled trial. Journal of medicinal food, v. 21, n. 6, p. 612-616, 2018. / CAMPBELL, Wayne W.; GEIK, Rachel A. Nutritional considerations for the older athlete. Nutrition, v. 20, n. 7-8, p. 603-608, 2004. / CRUZAT, Vinicius et al. Glutamine: metabolism and immune function, supplementation and clinical translation. Nutrients, v. 10, n. 11, p. 1564, 2018. / CRUZAT, Vinicius et al. Glutamina: aspectos bioquímicos, metabólicos, moleculares e suplementação. Revista Brasileira de medicina do Esporte, v. 15, n. 5, p. 392-397, 2009. / HECTOR, Amy J. et al. Whey protein supplementation preserves postprandial myofibrillar protein synthesis during short-term energy restriction in overweight and obese adults. The Journal of Nutrition, v. 145, n. 2, p. 246-252, 2015. / GUALANO, Bruno et al. Creatine supplementation in the aging population: effects on skeletal muscle, bone and brain. Amino Acids, v. 48, n. 8, p. 1793-1805, 2016.  / JÄGER, Ralf et al. International society of sports nutrition position stand: protein and exercise. Journal of the International Society of Sports Nutrition, v. 14, n. 1, p. 1-25, 2017. / MADADLOU, Ashkan; ABBASPOURRAD, Alireza. Bioactive whey peptide particles: An emerging class of nutraceutical carriers. Critical reviews in food science and nutrition, v. 58, n. 9, p. 1468-1477, 2018. / MAUGHAN, R.J. et al. IOC consensus statement: dietary supplements and the high-performance athlete Br J Sports Med 2018;0:1–17, doi:10.1136/ HILLIPS, Stuart M. et al. Supplemental protein in support of muscle mass and health: advantage whey. Journal of food science, v. 80, n. S1, p. A8-A15, 2015. / TARNOPOLSKY, Mark A. Potential benefits of creatine monohydrate supplementation in the elderly. Current Opinion in Clinical Nutrition & Metabolic Care, v. 3, n. 6, p. 497-502, 2000. / TOME, Daniel. Criteria and markers for protein quality assessment–a review. British Journal of Nutrition, v. 108, n. S2, p. S222-S229, 2012. / VOLPI, Elena et al. Essential amino acids are primarily responsible for the amino acid stimulation of muscle protein anabolism in healthy elderly adults. The American journal of clinical nutrition, v. 78, n. 2, p. 250-258, 2003. / WITARD, Oliver C. et al. Protein considerations for optimising skeletal muscle mass in healthy young and older adults. Nutrients, v. 8, n. 4, p. 181, 2016.

SUPLEMENTAÇÃO PROTEÍNAS VEGANAS E PROTEÍNAS DE ORIGEM ANIMAL: EFEITOS NO METABOLISMO PROTEICO

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Suplementos proteicos e aminoácidos são considerados, dentro do cenário da nutrição esportiva/estética, os produtos de maior interesse, procura e consumo por atletas e praticantes de atividade física. Independente do objetivo ser a melhora do desempenho esportivo, o aumento de massa muscular ou o emagrecimento, sempre há grande atenção e discussão em torno do consumo proteico diário. Algumas dúvidas quanto a melhor forma de consumo/suplementação como qual a quantidade ideal, o momento mais indicado para consumo, a fonte de proteína mais apropriada e a combinação ou não com demais nutrientes vem evoluindo bem em termos de evidências científicas nos últimos anos (Cintineo et al, 2018; Samal & Samal, 2018). Contudo, com a constante busca por mudanças no estilo de vida da população, um dos assuntos que ganhou repercussão foi acerca do padrão alimentar vegetariano/vegano sobre o metabolismo proteico. Com isso, os suplementos proteicos veganos surgem como alternativa. Porém, resta a dúvida: em termos de metabolismo proteico muscular, vegetarianos/veganos e carnívoros podem apresentar o mesmo resultado?

Se tratando de alimentação, proteínas se resumem a carnes, frango, peixes e ovo. Alimentos de origem vegetal como leguminosas e cogumelos possuem uma carga de proteína em sua composição, porém, não podem ser considerados como fonte de proteína. Por exemplo, 100 g de peito de frango possui aproximadamente 30g de proteína. Para termos o mesmo teor proteico, seria necessário consumir cerca de 1,2kg de shimeji ou 340g de grão de bico. O problema é que 100g de filé de frango não acrescentaria nada ao teor de carboidratos da dieta, enquanto que o shimeji e o grão de bico somariam 20 e 85g de carboidratos, respectivamente, ou seja, 80 e 340kcal a mais no plano dietético. Não podemos esquecer que, para quem tem por objetivo a perda de gordura, essas calorias a mais podem atrapalhar no delineamento da estratégia que preza pelo balanço energético negativo. Em função disso, suplementos proteicos veganos que agreguem valor no quesito proteína sem comprometer a ingestão calórica são considerados de alta aplicabilidade para quem deseja adotar um padrão vegano/vegetariano.

Comparando duas fontes proteicas distintas (whey protein isolado e proteína isolada do arroz), não necessariamente veremos diferença no teor de macronutrientes. Porém, ao olharmos o aminograma dos mesmos, certamente veremos que a proteína de origem vegetal possui menor quantidade de alguns aminoácidos em relação ao whey e vice-versa. A tabela abaixo ilustra a comparação entre os aminogramas destas fontes proteicas. Um dos maiores alvos de crítica sobre as proteínas veganas é a limitação na quantidade de leucina, aminoácido essencial conhecido como “gatilho biológico” para o estímulo da síntese proteica muscular.

De fato, se compararmos o efeito do consumo de 30g de whey protein isolado com 30g de proteína isolada do arroz, veremos que a síntese proteica muscular será superior frente ao consumo do soro do leite. Entretanto, a comparação não é justa uma vez que a composição destas doses é distinta em termos de aminoácidos essenciais. Para solucionar tal deficiência, Joy et al. (2013) propôs a comparação entre 25g de whey protein isolado com 36g de proteína isolada do arroz. Em outras palavras, os autores aumentaram a dose de consumo de proteína vegetal para compensar a deficiência de aminoácidos essenciais. Durante 12 semanas, 24 homens jovens e saudáveis foram submetidos ao treinamento de força progressivo e supervisionado e suplementaram as doses acima descritas no período pós-treino. O painel abaixo ilustra os resultados. Ambas as fontes proteicas promoveram aumento de volume e força muscular sem qualquer diferença entre elas. Em conclusão, é possível equivaler advindos de proteínas veganas aos de origem animal desde que a deficiência de aminoácidos essenciais da primeira seja compensada por meio do aumento da dosagem.

Outros estudos apontam para a alternativa de fortificar a fonte proteica com o aminoácido limitante. Como exemplo, Casperson et al. (2012) avaliou o efeito do consumo de uma dieta enriquecida com leucina (4g por refeição) em idosos que consumiam dieta hipoproteica (deficiente em aminoácidos essenciais). Como resultado, a dieta fortificada com leucina promoveu aumento de síntese proteica muscular e de marcadores pós-traducionais como mTOR e p70S6k.

O fato de optar pela adoção de um padrão alimentar vegetariano/vegano não é sinônimo de deficiências ou ineficiência proteica. Porém, é necessário que alguns pontos sejam considerados na intenção de adequar os fatores limitantes. Em primeiro lugar, considerar o contexto dietético de modo a garantir que, para o objetivo proposto, haja adequação calórica (balanço energético) e de carboidratos e gorduras. Segundo, considerar que alimentos vegetais com teor de proteína também carregam consigo uma concentração de carboidratos. Em terceiro, considerar o uso de suplementos proteicos veganos que, embora sejam deficientes em alguns aminoácidos essenciais, fornecem um bom aporte proteico sem comprometer a ingestão dos demais macronutrientes. Por fim, estudar o aminograma do produto e em função das limitações encontradas considerar a possibilidade de aumentar a dose de consumo ou complementar a suplementação com os aminoácidos essenciais deficientes.

Referências bibliográficas:

Casperson SL, Sheffield-Moore M, Hewlings SJ, Paddon-Jones D. Leucine supplementation chronically improves muscle protein synthesis in older adults consuming the RDA for protein. Clin Nutr. 2012 Aug;31(4):512-9. / Cintineo HP, Arent MA, Antonio J, Arent SM. Effects of Protein Supplementation on Performance and Recovery in Resistance and Endurance Training. Front Nutr. 2018 Sep 11;5:83. / Joy JM, Lowery RP, Wilson JM, Purpura M, De Souza EO, Wilson SM, Kalman DS, Dudeck JE, Jäger R. The effects of 8 weeks of whey or rice protein supplementation on body composition and exercise performance. Nutr J. 2013 Jun 20;12:86. / Samal JRK, Samal IR. Protein Supplements: Pros and Cons. J Diet Suppl. 2018 May 4;15(3):365-371.

Fonte: Vitaforscience