O número de praticante de modalidades de endurance (corrida, triatlon, ciclismo) cresce substancialmente a cada ano. No ano de 2015, nos Estados Unidos, o número de praticantes de triatlon era estimado em 2,5 milhões e, no mundo, em 3,5 milhões. Certamente, nos dias de hoje esse número é significativamente superior. Junto com a prática, cresce o número de evidências científicas acerca das estratégias nutricionais e de suplementação para estas modalidades. Tal crescimento também é justificado pela evolução do esporte dentro do cenário do alto rendimento esportivo. No ano de 2018, o queniano e campeão olímpico Eliud Kipchoge obteve o recorde mundial de maratona ao completar a prova em Berlim com o tempo de 2:01:39, algo que no passado era considerado sub-humano.
Sabemos que um ciclo de preparação para uma prova de longa duração é determinado pelas fases de treinamento. Para compreensão do profissional nutricionista (de forma simples e não técnica), a periodização se inicia no período de base/fundação, onde não há aumento substancial do volume de treino o que permite que a composição corporal seja alvo primário de atenção. Em seguida, inicia-se o aumento do volume de treino semana a semana. Nessa fase a dieta deve acompanhar esse aumento de volume para que a evolução e adaptação aos treinos ocorram. Ou seja, é a fase onde não se deve fase restrição calórica, mas periodizar a dieta em função dos estímulos mecânicos diários. A fase de volume termina no ˜pico de treino˜, onde as maiores distâncias são percorridas e a estratégia nutricional de prova deve ser testada e ajustada toda semana. Por fim, o polimento é a fase que antecede a prova e, nesse período, deve-se minimizar ao máximo a carga de estresse e favorecer a recuperação dos estoques de energia para prova. O conhecimento destas fases de treino e as respectivas condutas, permite que o profissional nutricionista possa periodizar a dieta ao longo do ciclo de acordo com o objetivo do treinamento.
Recentemente, alguns estudos sobre suplementação no âmbito do endurance foram publicados. Kato et al. (2018) avaliaram maratonistas (média de 26 anos) que passaram por 2 dias de adaptação: no primeiro dia, correram 10 km e no segundo 5 km. Durante esses dias, consumiram uma dieta com 8g de CHO/kg de peso corporal/dia e 1,4g/ de PTN/kg de peso corporal/dia. No terceiro dia, realizaram um treino longo de 20 km onde consumiram alguma das seguintes dietas:
1) 9g de CHO/kg de peso corporal/dia e 0,8g/ de PTN/kg de peso corporal/dia;
2) 8g de CHO/kg de peso corporal/dia e 1,75g/ de PTN/kg de peso corporal/dia;
3) 9g de CHO/kg de peso corporal/dia e 0,8g/ de PTN/kg de peso corporal/dia + BCAAs;
3) 9g de CHO/kg de peso corporal/dia e 0,8g/ de PTN/kg de peso corporal/dia + EAAs (aminoácidos essenciais).
O objetivo do estudo foi de avaliar qual a melhor conduta para recuperação muscular pós-esforço. Conforme apresentado na figura abaixo, o resultado demonstrou que as dietas 2 e 3 foram equivalentes em reduzir a oxidação proteica após o exercício, indicando que há uma maior necessidade de ingestão proteica que, se não for cumprida deve ser complementada com a suplementação de BCAAs.
Wall et al. (2011) submeteram 14 triatletas com média de 25 anos a suplementação de L-carnitina por 24 semanas afim de verificar os efeitos da suplementação sobre o desempenho esportivo em intensidade moderada (50% VO2 máx) e alta (80% VO2 máxi). O protocolo de suplementação foi composto de 80g de carboidratos + 2g de L-carnitina, 2 vezes ao dia. Ao final de 6 meses, os autores observaram que, em atividade moderada, o delta de glicogênio (utilização) foi menor frente a suplementação de L-carnitina. Já em alta intensidade, o delta de lactato (produção) foi menor no grupo suplementado em comparação ao placebo.
Por fim, de modo mais recente, têm-se discutido o “treinamento intestinal” dentro da prática de endurance com o objetivo de minimizar os possíveis desconfortos gastrointestinais e até mesmo fortalecer a microbiota para manutenção da imunidade. Neste contexto, os estudos com uso de probióticos associado a suplementação de L-glutamina tem demonstrado resultados promissores. A literatura acerca da suplementação de probióticos e endurance tem crescido substancialmente (Leite et al, 2018; Pyne et al, 2014; West et al, 2009). De modo complementar, a figura abaixo (extraída de Coqueiro et al, 2019) resume as principais funções da L-glutamina além do trato intestinal:
Embora não seja consenso da literatura, há evidências indicando que a glutamina pode aumentar a síntese de glicogênio muscular e reduzir o acúmulo de amônia induzido pelo exercício. A suplementação também pode atenuar marcadores de dano muscular e, consequentemente diminuir a sensação de dor muscular tardia, especialmente em indivíduos engajados em protocolos de treinamento de exaustão e/ou exercícios prolongados. Embora os efeitos acima descritos sejam evidentes no contexto do exercício, poucos resultados sobre desempenho esportivo foram observados na literatura.
Referências bibliográficas:
Coqueiro AY, Rogero MM, Tirapegui J. Glutamine as an Anti-Fatigue Amino Acid in Sports Nutrition. Nutrients. 2019 Apr 17;11(4).
Kato H, Suzuki K, Bannai M, Moore DR. Branched-Chain Amino Acids Are the Primary Limiting Amino Acids in the Diets of Endurance-Trained Men after a Bout of Prolonged Exercise. J Nutr. 2018 Jun 1;148(6):925-931.
Leite GSF, Resende Master Student AS, West NP, Lancha AH Jr. Probiotics and sports: A new magic bullet? Nutrition. 2019 Apr;60:152-160.
Pyne DB1, West NP, Cox AJ, Cripps AW. Probiotics supplementation for athletes – clinical and physiological effects. Eur J Sport Sci. 2015;15(1):63-72.
Wall BT, Stephens FB, Constantin-Teodosiu D, Marimuthu K, Macdonald IA, Greenhaff PL. Chronic oral ingestion of L-carnitine and carbohydrate increases muscle carnitine content and alters muscle fuel metabolism during exercise in humans. J Physiol. 2011 Feb 15;589(Pt 4):963-73.
West NP, Pyne DB, Peake JM, Cripps AW. Probiotics, immunity and exercise: a review. Exerc Immunol Rev. 2009;15:107-26.
Vitafor Science News